[PT] Pesquisa Atlas – Eleições Paraguai: Efraín Alegre e Santi Peña empatados tecnicamente na liderança

O Partido Liberal possui uma chance real de interromper novamente a hegemonia do Partido Colorado

Categoria

AtlasIntel

Data de publicação

15 mar 2023

Autor

Yuri Sanches

Segundo a mais recente pesquisa Atlas lançada em 14/03, há um empate técnico entre os candidatos do Partido Liberal e do Partido Colorado. Se as eleições fossem hoje, a chapa de Efraín Alegre/Soledad Núñez obteria 38% dos votos, enquanto a chapa de Santi Peña/Pedro Alliana receberia 36%. Payo Cubas obteria 14% do eleitorado, Chilavert e Euclides Acevedo, 3% cada. Em um cenário hipotético apenas com Efraín Alegre e Santi Peña, o candidato de oposição teria 42,5%, enquanto Peña teria 41% dos votos. No Paraguai não há um segundo turno: o candidato em primeiro lugar ganha a presidência independentemente da porcentagem de votos válidos que obteve.

Contexto

As eleições gerais no Paraguai estão agendadas para 30 de abril de 2023. Nelas, os paraguaios elegerão presidente e vice-presidente, 45 senadores, 80 deputados, 17 governadores e 17 conselhos departamentais. O presidente e governadores eleitos tomarão posse em agosto de 2023 e deixarão o cargo em agosto de 2028. Não há reeleição prevista na Constituição. Já os senadores e deputados iniciarão seus mandatos em 1º de julho de 2023.

Sistema político partidário do Paraguai

O sistema político-partidário no Paraguai é marcado por uma forte cisão entre duas forças políticas: o Partido Colorado e o Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA). Ambos os partidos têm raízes históricas profundas no país e dominam a vida política no Paraguai desde sua independência, em 1811.

O Partido Colorado, fundado em 1887, é o partido político mais antigo e mais tradicional do Paraguai e possui uma inclinação conservadora. Apesar de ter sido fundado bem antes da ditadura, o Partido Colorado é bastante associado por ter desempenhado um papel importante durante o regime autoritário do general Alfredo Stroessner (1954-1989). No entanto, a hegemonia do Partido Colorado não é produto apenas de sua ligação com o período ditatorial, mas remonta ao perfil histórico de dominação política no Paraguai, a partir de práticas clientelistas e também de identificações políticas enraizadas na sociedade. Desde a redemocratização, o partido tem lutado para modernizar-se e adaptar-se às exigências da população.

O Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA) tem raízes que remontam a 1887, mas adquiriu sua forma atual a partir de 1978. O Partido Liberal é considerado progressista, inclinado à centro-esquerda. É o maior partido da oposição e historicamente tem se oposto à hegemonia do Partido Colorado desde sua criação.

A oposição histórica entre o Partido Colorado e o Partido Liberal estabelece um contexto político-partidário que limita grandemente uma ascensão mais relevante da esquerda no Paraguai. Os interesses econômicos giram em torno desses dois partidos mais tradicionais e contribuem para a manutenção da polarização, enfraquecendo a chance de uma mudança radical de partido no poder. Como resultado, o governo à esquerda de Fernando Lugo não foi capaz de se viabilizar e, apesar de retirar o Partido Colorado da presidência pela primeira vez desde 1947, em 2008, sofreu um impeachment em 2012. O impeachment foi realizado em um processo rápido e controverso, que durou menos de 48 horas, sendo recebido por muitos como um golpe parlamentar.

Outros partidos políticos menores incluem a Frente Guasú, o Partido Democrático Progressista (PDP), o Partido Patria Querida (PPQ), o Partido do Encuentro Nacional (PEN) e o Movimento das Cruzadas Nacionais (MCN).

O Partido Colorado venceu as eleições presidenciais de 2018, elegendo Mario Abdo Benítez como o presidente do país com 48,9% dos votos. Efraín Alegre, candidato do Partido Liberal, terminou em segundo lugar, com 45% dos votos. Enquanto isso, nas eleições legislativas de 2018, o Partido Colorado obteve a maioria, tanto no Senado, quanto na Câmara dos Deputados.

A corrupção é um dos principais problemas do país. Após a revelação de um escândalo envolvendo a contratação de eletricidade pelo governo, o país passou por uma crise política em 2017. Vários políticos e empresários foram presos, e o caso ainda está sendo julgado. Outros temas em voga, atualmente, são a reforma eleitoral, a segurança pública e a melhoria da infra-estrutura. O Paraguai também tem enfrentado desafios de desenvolvimento econômico, pobreza e desigualdade social.

A revisão do acordo de fornecimento da energia de Itaipu ao Brasil, que ocorrerá em agosto de 2023, após 50 anos do tratado de Itaipu, também é um tema de destaque no país, que busca vender a energia paraguaia excedente para outros países além do Brasil.

Candidatos a presidência/vice-presidência

Partido Colorado

Santi Peña/Pedro Alliana

Santiago Peña tem 44 anos de idade e iniciou sua carreira política como economista do Banco Central, entre 2000 e 2009. De 2015 a 2017, ele foi Ministro da Fazenda no governo de Horacio Cartes. Peña implementou reformas tributárias durante seu mandato como ministro.
Peña concorreu à presidência pelo Partido Colorado em 2018, mas foi derrotado no primeiro turno pelo candidato do Partido Colorado, o atual presidente, Mario Abdo Benítez.

Peña é um candidato que possui atributos positivos, mas seu principal problema é ser visto como um candidato da continuidade, de um partido que é muito rejeitado pelos jovens, além de ser associado ao ex-presidente Horacio Cartes, implicado em casos de corrupção. Seu perfil jovem é ideal para desconstruir a imagem negativa do Partido Colorado e reformulá-lo. No entanto, esse desafio é complexo e pode não ser suficiente.

Partido Liberal

Efraín Alegre - Presidente

Efraín Alegre é um político tradicional que atualmente lidera o Partido Liberal. Iniciou sua carreira política em 1983, como líder estudantil. Foi presidente da câmara dos deputados entre 1999 e 2003 e em 2008 foi eleito senador e líder do partido no Senado. Alegre também serviu como Ministro de Obras Públicas no governo Fernando Lugo. Alegre concorreu à presidência nas duas últimas eleições: em 2013 perdeu para Horacio Cartes e em 2018 para Mario Abdo Benítez, ambos do Partido Colorado.

Apesar de o Partido Liberal carregar a responsabilidade de liderar a oposição ao Partido Colorado e atrair eleitores que desejam uma mudança, o perfil de Efraín Alegre pode ser um entrave. Alegre tem 60 anos de idade e é visto como um político tradicional e pouco carismático. Para superar esse desafio, fez uma aliança com Soledad Núñez, de perfil jovem, promissor e que poderia encarnar o desejo de mudança dos paraguaios.

Soledad Núñez - Vice-Presidente

Soledad Núñez tem 39 anos de idade e atuou como ministra secretária executiva da Secretaria Nacional de Habitação e Habitat do Paraguai (Senavitat) de 2014 a 2018.

Núñez é uma das políticas mais promissoras da oposição e chegou a anunciar sua candidatura presidencial para a Concertação Nacional em maio de 2022. No entanto, não conseguiu viabilizar sua candidatura como cabeça de chapa e teve que aceitar o papel de vice-presidente na chapa de Efraín Alegre.

Cruzada Nacional

Payo Cubas/Stilber Valdez

Payo Cubas é um político controverso, que possui um discurso populista, focado em questões de moralidade e caça de corruptos. Ele foi congressista por um mandato como membro do partido de centro-esquerda Encuentro Nacional de 1993 a 1998 e, mais recentemente, eleito para o Senado em 2018 como membro do partido de centro-direita Cruzada Nacional. Foi marcado por comportamento inapropriado e até mesmo brigas com outros congressistas.

Em 2019, ele teve o mandato cassado por incitação ao crime, após ser filmado incitando a morte de 100 mil brasileiros entre os 2 milhões que vivem no Paraguai, por supostamente serem “bandidos”.

Nueva República

Euclides Acevedo/Jorge Querey

Acevedo foi membro do partido Encuentro Nacional (PEN) no Congresso de 1997 a 2003. Ele serviu em duas presidências do Partido Colorado como membro do Gabinete, mais recentemente como Ministro do Interior e depois como Ministro das Relações Exteriores sob o atual Presidente Mario Abdo Benítez. Acevedo renunciou a concorrer à presidência e agora é membro do recém-formado movimento Nueva República.

Acevedo planeja apelar aos eleitores de esquerda, selecionando Jorge Querey, senador da Frente Guasú e um dos médicos de Lugo, como seu companheiro de candidatura.

Partido de la Juventud

José Luis Chilavert/Sofia Scheid

Chilavert, de 57 anos, teve uma carreira de sucesso como goleiro no futebol sul-americano e europeu, tendo sido um dos melhores jogadores de sua posição na década de 1990 e tendo representado o Paraguai em três Copas do Mundo.

Chilavert é um dos nomes que despontam como uma alternativa de oposição ao Partido Colorado. Tem enfatizado em sua campanha a necessidade de combater a corrupção, reduzir a pobreza e a desigualdade, e melhorar a infraestrutura do país.

No entanto, Chilavert também tem sido alvo de controvérsias em sua carreira fora do futebol. Ele foi suspenso diversas vezes por agressões a outros jogadores e, em 2002, foi acusado de agredir um motorista de táxi. Além disso, ele tem uma posição política controversa, criticou publicamente líderes de esquerda, como Hugo Chávez e Evo Morales, e a política externa dos Estados Unidos.

Resultados da pesquisa Atlas

Sede de mudança x limitações dos candidatos

Além disso, a maioria da população paraguaia (55%) deseja uma mudança no partido de governo e prefere que o próximo presidente seja da Concertación ou de outro partido de oposição. São 36% os que preferem a continuidade do Partido Colorado. Mesmo entre eleitores que ainda não sabem se irão votar, para 49% a principal motivação para comparecerem às urnas seria a oportunidade de uma alternância de poder.

Apesar do desejo por mudança, a disputa parelha revela as limitações que cada candidato possui para adequar suas imagens aos anseios da população. Embora o Partido Liberal seja a principal esperança de derrotar a hegemonia colorada, Efraín Alegre não é visto como um político de mudança, mas como um político tradicional. Isso, portanto, limita sua capacidade de capitalizar em cima do desejo da maioria da população por uma mudança no governo.

Ao mesmo tempo, a limitação de Efraín contribui para que um percentual importante de votos seja direcionado a outros candidatos de oposição, que incorporam melhor a imagem da mudança. Exemplo disso é o fato de Payo Cubas ter, atualmente, 14% de intenção de voto, sendo um político com uma retórica mais radical, populista e controversa.

Do lado de Santi Peña, embora sua imagem seja de um político jovem e habilidoso, seu crescimento é limitado pela dificuldade em se desassociar da imagem negativa de um partido hegemônico e que enfrenta acusações de corrupção. Além disso, seus laços com o ex-presidente Horacio Cartes impactam negativamente a disposição de parte do eleitorado de votar a seu favor.

Fidelidade partidária e espaço para mudança de votos

Até aqui, o patamar atual de intenção de votos de Efraín Alegre e Santi Peña parece em boa parte consolidado: mais de 90% de seus respectivos eleitores indica que sua decisão de voto é final.
Contudo, tanto Efraín quanto Peña possuem o desafio de evitar que os paraguaios filiados aos seus respectivos partidos votem em outro candidato. Por uma característica específica do Paraguai, boa parte da população é filiada a algum partido ou movimento político, embora isso não necessariamente signifique uma simpatia por ele.

Segundo a pesquisa Atlas, Peña atrai cerca de 66% dos eleitores filiados ao Partido Colorado; outros 15% pretendem votar em Efraín Alegre, além de 12% que pretendem votar em Payo Cubas. Já Efraín, consegue atrair 77% dos filiados ao Partido Liberal, mas seu grande desafio é persuadir a parcela de 13% que pretende votar em Payo Cubas.

Além disso, 12% dos filiados ao Partido Colorado afirmaram que sua decisão de voto não está fechada e ainda poderia mudar. Já entre filiados ao Partido Liberal, 97% creem já terem tomado sua decisão final.
As demografias paraguaias que mais desejam a alternância de poder são os mais jovens (18-24 anos), os mais pobres e habitantes das regiões Ocidental e Oriental Norte, além daqueles da região Oriental Centro do país.

Voto estratégico a favor da mudança dá boas chances de vitória do Partido Liberal

Apesar das limitações da imagem de Efraín em atrair o eleitor que deseja a mudança, é possível que haja um movimento de voto estratégico que o beneficie. É possível que parcela da população perceba que nenhum outro candidato seria capaz de vencer Santi Peña e migre seus votos para Efraín para garantir que o Partido Colorado seja derrotado.

Isso dá ao Partido Liberal boas chances de vitória, caso consiga atrair esse eleitorado. Esse cenário constituiria uma forte derrota ao Partido Colorado e configuraria um dos raros episódios em que ele foi retirado do poder desde 1947, somando-se à vitória de Fernando Lugo, em 2008. Por ser um partido hegemônico tão forte, há reflexos importantes na política e na economia do Paraguai. A governabilidade é um tópico chave, para que um possível governo do Partido Liberal não sofra com as crises sociais e políticas que culminaram no impeachment de Fernando Lugo.

Há também interesses externos envolvidos na eleição, principalmente após recentes e contundentes posicionamentos públicos da embaixada dos Estados Unidos no Paraguai, contra figuras do Partido Colorado denunciadas em casos de corrupção, como o ex-presidente Horacio Cartes. Cartes teve sua entrada nos EUA proibida e seus bens no país congelados por indícios de envolvimento em corrupção após investigações do Departamento de Tesouro do governo americano. O ex-presidente paraguaio nega as acusações e vê motivação política na ação.

Imagem de líderes políticos

Kattya Gonzalez e Sole Núñez possuem a melhor avaliação de imagem entre os políticos no Paraguai, com 44% e 43%, respectivamente, tendo uma imagem positiva a seu respeito. Sole Nuñez, aliás, possui a menor imagem negativa, para apenas 23%. No entanto, cerca de um terço dos paraguaios disse ainda não ter uma opinião formada a seu respeito.

Efraín Alegre possui uma imagem dividida na sociedade: possui 40% de imagem positiva e 43% de imagem negativa. Esse resultado, no entanto, é levemente melhor que o de seu rival Santi Peña. Enquanto possui uma imagem positiva para 38%, são 50% os que têm uma imagem negativa sobre ele.

Lideranças do Partido Colorado, como Santiago Peña, seu candidato a vice Pedro Alliana, o ex-presidente Horacio Cartes e o atual Mario Abdo têm as piores percepções de suas imagens. Todos possuem imagens negativas para mais de 50% da população, chegando a 67% no caso de Mario Abdo.

Aprovação do governo

A desaprovação de Mario Abdo foi de 64,5%, enquanto que a aprovação foi de apenas 18,6%. A desaprovação foi majoritária entre todas as categorias demográficas observadas e ultrapassou 60% em quase todos os estratos da sociedade, segundo a pesquisa.

Já o governo de Mario Abdo é avaliado como regular por 46% e ruim ou muito ruim por 43% dos paraguaios. Apenas 7% da população acredita que o governo é excelente ou bom. O mesmo padrão de avaliação também é observado na maioria dos grupos demográficos da pesquisa Atlas.

Demandas sociais

A pesquisa captou também quais são atualmente os maiores problemas para os paraguaios. Os mais citados foram a corrupção (65%), o acesso a serviços de saúde e medicamentos gratuitos (56%), e a insegurança (40%).

Metodologia

A pesquisa Atlas teve uma amostra de 1.600 respondentes entre 10 e 13/03, com coleta via web. A margem de erro é de 2 p.p., para um nível de confiança de 95%.

Autor

Yuri Sanches

Categoria

AtlasIntel

Data de publicação

15 mar 2023

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